Notas de um crime sem castigo
Esses dias eu e minha companheira maratonamos Aruanas, série da plataforma Globoplay, com texto de Estela Renner e Marcos Nisti e direção de Carlos Manga Jr., não é uma série longa, contém apenas uma temporada até então, e apenas 10 episódios. Com o tema: a luta pela preservação do meio ambiente, a série traz a tona uma verdade pouco noticiada nos grandes veículos de comunicação.
Fazendo uma breve resumo sem spoliers, a série tem como protagonistas a jornalista Natalie (interpretada por Débora Falabella), a ativista Luiza (interpretada por Leandra Leal) e a advogada Verônica (interpretada por Taís Araujo), três amigas de infância que fundaram a ONG Aruana. Além das três, também protagoniza a série a personagem Clara (interpretada por Thainá Duarte).
Essas quatro personagens se juntam numa história de ação, aventura e mistério para enfrentar a mineradora KM após receberem uma denúncia de que a empresa é responsável pelo aumento de doenças neurológicas em uma cidade à margem da Floresta Amazônica. A maior parte da série se passa na cidade fictícia Cari, localizada no Amazonas e nessa pegada de série investigativa a trama vai se desenrolando tocando em diversos pontos para além da destruição do meio ambiente como, por exemplo, o genocídio dos povos originários, exploração sexual infantil e corrupção.
Ano passado (2020) a série foi transmitida na TV aberta, num momento em que o assunto: devastação da Amazônia tem ocupado pouco espaço na imprensa e apesar de ter sido muito elogiada (e merece todos esses elogios) não despertou nenhum debate mais amplo. Só em junho a Amazônia teve o maior número de queimadas em 13 anos, e isso acontece em menos de um ano depois do “Dia do Fogo”que completou 1 ano no dia 10 de agosto (SEM NENHUM PRESO OU INDICIADO), lembrando que esse crime teve consequências tão graves que no dia 19 de agosto de 2019 o céu estava completamente cinza e o sol estava colorido de um vermelho opaco em algumas cidades do sul e sudeste do país devido às queimadas.
Eu não sei qual palavra usar para descrever tamanha indignação e revolta, afinal além de termos de lidar com o desgoverno proposital e ausências de políticas públicas no âmbito federal em relação à Covid-19, presenciamos o total descaso com a pauta ambiental.
E toda vez que vejo notícias ou penso nesse assunto, lembro da fala do ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) no vídeo da reunião ministerial de 22 de abril defendendo que o governo deveria aproveitar a pandemia para promover a desregulamentação de mecanismos de proteção ambiental. Mesmo depois dessa atrocidade ter vindo a público, o Ministro continua no seu cargo, mostrando que o Governo Federal defende a pauta do desmatamento.
O “ciclo do fim” já está bem desenhado, primeiro vem o desmatamento e em seguida o fogo, segundo os especialistas, os criminosos esperam a mata derrubada secar por alguns dias antes de incendiar. Taroba Uru-Eu-Wau-Wau denuncia que a destruição da floresta é muito rápida. Segundo o cacique, depois de tirar a madeira, os criminosos queimam a área e jogam sementes de capim. Em seguida o capim vira pasto, de acordo com os dados da pesquisa da Unir, o desmatamento ilegal serve para ampliar áreas de pastagem. Aos poucos, as pastagens têm se convertido em plantações, como de soja, afirma a pesquisadora Maria Madalena Cavalcante (DADOS TIRADOS DAS NOTÍCIAS DW).
E essa política de desmatamento não é invenção do desgoverno de Bolsonaro, pelo contrário, a Ditadura Militar começou a monitorar a Amazônia por satélite para poder destruí-la melhor nos anos 1970. Explicitamente a Ditadura Militar investiu, propagandeou e incentivou o desmatamento da Amazônia para a formação de pastagem.
Em 2020, mesmo em um Estado Democrático de Direito (pelo menos oficialmente) os militares voltaram a tomar conta da pasta, uma vez que técnicos de equipes de fiscalização ambiental estão sendo demitidos e em seus lugares estão assumindo um comando militar concentrado no Ministério da Defesa, e essa concentração de poder pelos militares enfraquece políticas para Amazônia e abre caminho para mais desmatamento e queimadas. Literalmente o Brazil está matando o Brasil.
Política ambiental e floresta de pé não é coisa só de ONG e indígenas, todos nós que respiramos temos direito “ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” e essas palavras bonitas estão estampadas na nossa Constituição no art. 225 que ainda completa: “impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
A Constituição Cidadã agora mais do que nunca está parecendo conto de fadas dentro de um cenário político digno de filme de terror, saiu de cena o Drácula e agora estamos sendo desgovernados pela Mula sem cabeça.
Texto de Aryelle Almeida
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